terça-feira, 20 de outubro de 2009

"Complexa e polêmica, a reprodução assistida desperta intenso debate mundial" - Henrique Carlos Gonçalves

Reprodução assistida
A exemplo do novo Código de Ética Médica, revisado 20 anos depois, também as resoluções éticas de temas específicos, como a que dispõe sobre reprodução assistida, precisam ser aprimoradas à luz da prática médica mais atual e dos anseios da população
O advento do novo Código de Ética Médica, recém-homologado e publicado, marca o início de outros desafios a serem enfrentados pelos Conselhos de Medicina e pela sociedade. Dentre outros temas, os conselheiros deverão iniciar um processo de revisão e atualização das normas éticas nas práticas de reprodução assistida. A última norma do CFM sobre a matéria data de 1992 e, diante dos avanços tecnológicos e científicos, o Brasil necessita, com urgência, atualizar tal regramento. Não há que se criar obstáculos às pesquisas científicas, mas não se pode olvidar dos preceitos éticos tão importantes na prática em pauta. As implicações dos modernos procedimentos da reprodução assistida nas relações humanas exigem profunda reflexão e não se exaure no âmbito dos profissionais da área, dos pesquisadores, dos legisladores e dos juristas. O problema de infertilidade humana abriga, sem dúvida, um dos maiores dilemas éticos da Medicina na atualidade. Os avanços da ciência colocam em debate preceitos éticos; porém, desde que a infertilidade foi considerada doença, recebendo classificação internacional no catálogo CID-10, é possível ser superada por tratamento médico do casal afetado. Consequentemente, assistimos, cada vez mais, casais buscarem clínicas privadas especializadas em reprodução assistida. Até mesmo alguns serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) já começam a oferecer tratamento para garantir o direito de ser pai e mãe e assegurar a gestação em mulheres que têm dificuldades para engravidar, pois diferentemente de muitos paises desenvolvidos, a cobertura das Técnicas de Reprodução Assistida (TRA) pelo SUS é oferecida desde 2005 no Brasil. A exemplo do novo Código de Ética Médica, revisado 20 anos depois, também as resoluções éticas de temas específicos, como a que dispõe sobre reprodução assistida, precisam ser aprimoradas à luz da prática médica mais atual e dos anseios da população. Reavaliar os meios diagnósticos e terapêuticos disponíveis no campo da reprodução humana é, portanto, mais uma resposta dos Conselhos de Medicina à sociedade.Nesta seara, novas questões éticas têm sido colocadas e velhos dilemas têm sido revisitados, seja em função do exercício da Medicina, da cultura em transformação, da ética em pesquisa, ou da implementação de novas políticas de saúde. Desde o nascimento da inglesa Louise Brown, conhecida como o primeiro bebê de proveta do mundo, muitas questões éticas, com grande impacto na mídia e na opinião pública, têm sido colocadas à prova, seja em relação às mais simples e precursoras técnicas de insemi¬nação artificial até as técnicas modernas de fertilização in vitro, passando pelas situações complementares como doação de óvulos, sêmen, embriões, sexagem, assim como o congelamento de material biológico reprodutivo e de embriões.Complexa e polêmica, a reprodução assistida desperta intenso debate mundial. Vários países têm leis e regulamentações bem definidas, outros estão em vias de fazê-lo. No Brasil não existe, ainda, um marco legal abrangente, sendo que mais de uma dúzia de propostas legislativas e projetos de lei tramitam na Câmara dos Deputados. Os pontos que tecem o pano de fundo dessa discussão, e que deverão ser considerados pelos Conselhos de Medicina na revisão da Resolução da reprodução assistida são a falta de consenso entre os conceitos de maternidade e paternidade biológica e afetiva, o direito dos filhos de conhecerem suas origens biológicas, as repercussões jurídicas em relação à herança e patrimônio, o funcionamento de bancos de óvulos e esperma, a gestação de substituição (barriga de aluguel), o destino de embriões congelados e a clonagem terapêutica de células embrionárias, dentre outros entraves.Há também a necessidade de adequar as técnicas de obtenção de óvulos, no sentido de reduzir o padecimento das mulheres submetidas às técnicas de reprodução assistida, para não falar da sua mercantilização. Sem dúvida há que se estimular o avanço de metodologias que permitam ajustar o número de embriões transferidos e os de fato gerados, para não falar do risco da sua comercialização, ou mesmo da sua utilização nas parcerias público-privadas. Há também que estimular o diagnóstico e tratamento precoces de problemas de infertilidade, que podem ser superados por tratamentos hormonais, prevenindo o encaminhamento para esses procedimentos.Diante da crescente demanda de casos e de consultas no Estado de São Paulo, o Cremesp, nos limites de sua competência normativa, deverá iniciar o debate do tema e a formulação de propostas no âmbito da ética e da legislação pertinente.
Henrique Carlos GonçalvesPresidente do Cremesp
artigo redigido pelo Presidente do Cremesp (Dr. Henrique Carlos Gonçalves), publicado na Revista Ser Médico. Vejam link: http://www.cremesp.com.br/?siteAcao=Jornal&id=1198

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