quinta-feira, 26 de abril de 2012

O protagonismo do Supremo e a falta de protagonismo do Poder Legislativo

Em um excelente artigo publicado na Folha de São Paulo ( 25/04/2012), Ives Gandra da Silva Martins, advogado, professor e jurista de grande prestígio nos alerta sobre o protagonismo que o Supremo Tribunal  Federal vem exercendo atualmente. Não obstante a enorme tarefa que o Supremo Tribunal Federal tem exercido com o intuito de corrigir e sanar enormes injustiças sociais, o alerta de Ives Gandra é de enorme importância:

"Um dos mais importantes pilares da atual Constituição foi a conformação de um notável equilíbrio de poderes, com mecanismos para evitar invasão de competências. O Supremo Tribunal foi guindado expressamente a "guardião da Constituição" (artigo 102), com integrantes escolhidos por um homem só (artigo 101, § único), o presidente da República, que é eleito pelo povo (artigo 77), assim como os integrantes do Senado e da Câmara (artigos 45 e 46). O Congresso Nacional tem poderes para anular quaisquer decisões do Executivo ou do Judiciário que invadam a sua função legislativa (artigo 49, inciso XI), podendo socorrer-se das Forças Armadas para mantê-la (artigo 142), em caso de conflito. Há, pois, todo um arsenal jurídico para assegurar a democracia no nosso país. Ora, a Suprema Corte brasileira, constituída no passado e no presente por ínclitos juristas, parece hoje exercer um protagonismo político, que entendo contrariar a nossa Lei Suprema. Assim é que, a partir dos nove anos da gestão Lula e Dilma, o Pretório Excelso passou a gerar normas. Para citar apenas alguns casos: empossar candidato derrotado -e não eleito direta ou indiretamente- quando de cassação de governantes estaduais (artigo 81 da Constituição); a fidelidade partidária, que os constituintes colocaram como faculdade dos partidos (artigo 17, § 1º); o aviso prévio (artigo 7º, inciso XXII); a relação entre homossexuais (artigo 226, § 3º); e o aborto dos anencéfalos (artigo 128 do Código Penal). Tem-se, pois, duas posturas julgadoras drasticamente opostas: a dos magistrados de antanho, que nunca legislavam, e a dos atuais, que legislam. Sustentam alguns constitucionalistas que vivemos a era do neoconstitucionalismo, que comportaria tal visão mais abrangente de judicialização da política. Como velho advogado e professor de direito constitucional, tenho receio dos avanços de um poder técnico sobre um poder político, principalmente quando a própria Constituição o impede (artigo 103, § 2º). Nem se argumente que ação de descumprimento de preceito fundamental -de cuja redação do anteprojeto participei, ao lado de Celso Bastos, Gilmar Mendes, Arnoldo Wald e Oscar Corrêa- autorizaria tal invasão de competência, visto que essa ação objetiva apenas suprir hipóteses não cobertas pelas demais ações de controle concentrado. Meu receio é que, por força dos instrumentos constitucionais de preservação dos poderes, numa eventual decisão normativa do STF de caráter político nacional, possa haver conflito que justifique a sua anulação pelo Congresso (artigo 43, inciso XI), o que poderia provocar indiscutível fragilização do regime democrático no país. É sobre tais preocupações que eu gostaria que magistrados e parlamentares se debruçassem para refletir. IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, 77, advogado, professor emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra, é presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio " 

A questão que fica em sua essência não é somente o protagonismo do Supremo, mas sim o nível intelectual, ético e social da grande maioria dos políticos que elegemos, e que contribuem de forma direta para que o Supremo tenha que "legislar" além de julgar.  


2 comentários:

  1. A questão do STF em "legislar" é um assunto delicado: apesar dele ser o mais qualificado em preencher as lacunas deixadas pelo Congresso, tal poder deve se conter nos limites da Constituição Federal!

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  2. Realmente Lucas, sob pena dos poderes constituídos protagonizarem cenas de desrespeito e afronta a democracia de nosso país. Inlusive nos últimos tempos os conflitos entre os poderes passaram a ocorrer de forma habitual.

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